A neuropediatra Dra. Deborah Kerches aborda sobte Apraxia:
O dia 14 de maio é o Dia da Conscientização sobre Apraxia de Fala na Infância. No Brasil estima-se uma prevalência de 1 para cada 1000 crianças e nos EUA, 2 para cada 1000 crianças.
O objetivo do artigo de hoje é oferecer informações que alertem para esta condição que, infelizmente, ainda é pouco conhecida e diagnosticada no nosso país.
A criança “que não fala”, que apresenta atraso na aquisição e desenvolvimento da linguagem verbal, costuma ser preocupação frequente e de procura por especialistas precocemente.
A questão é que muitos profissionais costumam orientar os pais que o desenvolvimento da linguagem verbal tem suas particularidades e que “cada criança tem o seu tempo”. Embora cada criança se desenvolva dentro da sua individualidade, existem marcos do desenvolvimento que devem ser respeitados e qualquer atraso ou perdas de habilidades já adquiridas devem ser um sinal de alerta para intervenção adequada, independente do diagnóstico.
Nos primeiros anos de vida, a neuroplasticidade (capacidade que o nosso cérebro tem em se adaptar, moldar, estabelecer novas conexões cerebrais quando sujeito a estimulações e novas experiências) se encontra em sua fase mais intensa e em ritmo frenético. Esses anos são muito importantes para estimularmos a criança que apresente qualquer atraso em seu desenvolvimento. Na estimulação do desenvolvimento da fala, estes primeiros anos são cruciais!!!
A Apraxia de Fala é definida como um distúrbio neurológico motor que afeta a habilidade em produzir e sequencializar os sons da fala, na ausência de déficits neuromusculares. A Apraxia de fala reduz a capacidade de produzir corretamente sílabas e palavras tornando a comunicação verbal limitada e/ou pouco clara.
Pode ser adquirida quando causada por algum insulto em área cerebral responsável pela percepção e planejamento motor da fala como: acidente vascular cerebral (AVC), má formação do SNC, infecções, traumas, anóxia neonatal, entre outros, durante ou após o nascimento da criança ou ainda ser idiopática (causa desconhecida).
Como existem diferentes tipos e causas para atrasos e distúrbios da fala e da linguagem, a Apraxia de Fala é, muitas vezes, confundida com outras condições.
Para o diagnóstico, são necessárias a avaliação de um especialista em desenvolvimento infantil (neuropediatra) e uma avaliação fonoaudiológica. A profissional capaz de avaliar todas as questões detalhadas do desenvolvimento da fala é a fonoaudióloga.
Geralmente só é possível diagnosticar a Apraxia de Fala após os 2 -3 anos, quando é esperado que a criança já seja capaz de produzir um maior repertório de sons da fala e compreenda instruções necessárias para uma avaliação especializada.
Aspectos emocionais e cognitivos devem fazer parte da avaliação e diagnóstico diferencial.
As características e sintomas envolvidos na Apraxia de Fala não estão relacionados diretamente a alterações de hipofuncionamento, musculares e das estruturas fonoarticulatórias, mas sim, à falha na informação da percepção e planejamento motor dos movimentos que exijam uma sequência e organização (sopro, bico, por exemplo) e sons (fala).
Os principais sinais da Apraxia de Fala na Infância são:
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Pequeno repertório de palavras e erro na hora de pronunciar as vogais ou as consoantes;
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Uso somente de vogais para pronunciar algumas palavras (usa, por exemplo, “ao” para se referir a “gato”);
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Uso de somente uma sílaba da palavra;
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Domínio para falar somente palavras de uma sílaba (como “boi”);
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Dificuldade na hora de repetir uma sequência, como, por exemplo, “ta/ta/ta” ou “pa/ka/ta”;
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A criança pode falar uma vez determinada palavra e depois não repetir mais vezes;
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Uso de gestos para substituir algumas palavras;
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Fala lenta ou acelerada;
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Entonação e/ou acentuação errada na hora de pronunciar algumas palavras;
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Dificuldade na movimentação dos lábios e/ou língua (na hora de “mandar beijinho” ou “fazer bico”, colocar a língua para fora, para cima) – entende o comando, mas não é capaz executar;
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Criança não consegue encher a bochecha com ar e/ou apresenta sopro baixo;
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Dificuldade para mastigar e se alimentar de forma geral, preferindo alimentos pastosos;
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Dificuldade para controlar a saliva;
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Dificuldade para tarefas que precisam de controle voluntário;
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Os pais percebem que a criança compreende a ordem, conhece a palavra, se esforça para falar, mas não é capaz de produzir o som da palavra adequadamente.
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Crianças com Apraxia de Fala podem se tornar mais introspectivas e de difícil interação social por apresentarem dificuldade em se comunicar verbalmente.
Importante ressaltar que, na Apraxia de Fala isolada, há intenção comunicativa e capacidade de se comunicar através de outros recursos de linguagem preservados.
Distúrbios de praxia de fala podem estar presentes isoladamente ou como comorbidades com outras condições como: Transtorno do Espectro Autista (nem sempre o diagnóstico diferencial ou como comorbidade no autismo é fácil!), síndromes genéticas (por exemplo, Síndrome de Down, Síndrome do X frágil, Síndrome de Prader-Willi), TDAH, algumas síndromes epilépticas, erros inatos do metabolismo (galactosemia), entre outros.
A terapia fonoaudiológica deve ser individual, intensiva, precoce e adequadamente planejada. A suspeita diagnóstica de Apraxia de Fala justifica a intervenção imediata, mesmo sem diagnóstico fechado.
É importante que durante este processo de intervenção a criança seja capaz de se expressar por outros meios, para não se perder momentos importantes de aprendizagem (gestos, escrita, figuras podem ser recursos utilizáveis).
O treino da fala deve ser continuado em casa pelos pais e cuidadores para potencializar o tratamento.
A intervenção precoce e especializada fará a diferença não somente no desenvolvimento da fala, mas também nas questões sociais e emocionais da criança.
Crianças com Apraxia de Fala:
SABEM mais do que DIZEM
PENSAM mais do que FALAM
ENTENDEM mais do que você IMAGINA!